Em Timor-Leste, 89% dos adolescentes não praticam atividades físicas suficientes, revela Organização Mundial da Saúde

Estudo indica que existem sinais de que a atividade física tem um impacto positivo no desenvolvimento cognitivo e nas relações sociais e que grande parte dos benefícios continuam na idade adulta/Foto: Manuel Ribeiro

Exercício físico contribui para a saúde mental e ajuda a prevenir uma série de doenças. Relatório citou a falta de programas de promoção da atividade desportiva nos vários contextos sociais, como espaços públicos, escolas ou instituições.

Em Timor-Leste, 89% dos adolescentes (11-17 anos) não cumprem as recomendações mínimas da Organização Mundial da Saúde (OMS) para a prática de atividades físicas diárias, que preveem pelo menos uma hora de exercício, com intensidade moderada. O movimento corporal contribui para a saúde mental e ajuda a prevenir diabetes, doenças cardiovasculares e respiratórias, obesidade e cancro, colaborando para o bem-estar a longo prazo. As informações fazem parte do relatório Global Status on Physical Activity 2022 (o mais atual), da OMS.

O estudo também indica que existem sinais de que a atividade física tem um impacto positivo no desenvolvimento cognitivo e nas relações sociais e que grande parte dos benefícios continuam na idade adulta. A OMS ainda destaca que crianças devem ter períodos limitados à frente dos ecrãs de aparelhos, como computadores e telemóveis, e que há uma relação entre o tempo de uso desses dispositivos e o sedentarismo. Os menores, por estarem numa fase da vida de muitas mudanças e amadurecimento da personalidade, são os mais vulneráveis.

No documento, consta que o progresso para atingir os objetivos do Plano de Ação Global sobre Atividade Física 2018-2030, com uma meta de redução dos índices de sedentarismo em 15% até 2030, está a ser lento e desigual. Em Timor-Leste, onde 46% da população (1,3 milhões de habitantes) tem menos de 20 anos, isso reflete-se na falta de programas de promoção da atividade desportiva nos vários contextos sociais, como espaços públicos, escolas ou instituições.

A nível global, a percentagem de adolescentes sedentários é de 80%, refere o estudo.

OMS recomenda aos menores a prática de pelo menos uma hora de exercício físico com intensidade moderada/Foto: DR

A OMS ressalta que a prática de atividades físicas é importante em qualquer idade. No caso dos adultos, a OMS recomenda a realização semanal de 150 a 300 minutos de exercícios com intensidade moderada, ou 75 a 150 minutos de forma vigorosa, no mínimo. Quanto às grávidas e mulheres em situação de pós-parto, o ideal é fazer exercício físico moderado pelo menos 150 minutos por semana.

O médico José de Deus Alves afirmou que o sedentarismo é um fator que propicia o surgimento de doenças não transmissíveis, aumentando o risco de ataques cardíacos, AVC, diabetes, etc. O  profissional explicou que, quando uma pessoa não se mexe, as calorias que consumiu não são devidamente digeridas e, em vez de se transformarem em energia, ficam “guardadas” como gordura.

“Esta gordura entope os vasos sanguíneos, aumentando consequentemente a pressão arterial, que normalmente resulta em hipertensão ou noutras consequências a nível cardiovascular. Já a hipertensão e a diabetes podem contribuir para o aparecimento de problemas renais”, acrescentou o médico, que também é nutricionista.

Deu ainda o exemplo de alguns casos de condutores de transportes públicos que se queixaram com dores na parte inferior das costas. “Isto acontece porque não mexem o corpo. A coluna vertebral sofre as consequências dessa falta de movimento. Isso acontece também quando uma pessoa passa o dia em pé”, avançou.

O profissional destacou ainda que passar muito tempo sentado e consumir açúcar em excesso são dois fatores que influenciam o aparecimento da diabetes, por exemplo. O pâncreas é o órgão responsável pela produção de insulina, que, por sua vez, regula os níveis de glicose. Se essa produção for insuficiente, dado o consumo excessivo de açúcar, o risco de desenvolver diabetes aumenta naturalmente.

José Alves defende um maior cuidado nos hábitos alimentares e na realização de atividade física, assegurando que o sangue circule com fluidez e que o corpo funcione bem.

Classificado pelo Banco Mundial como um país com rendimento médio-baixo, Timor-Leste tem uma despesa anual de cerca de 263 mil dólares americanos para tratar de doenças não transmissíveis e saúde mental, associadas ao sedentarismo, revela o relatório da OMS. As doenças não transmissíveis – cardiovasculares (ataque cardíaco), oncológicas (cancro), respiratórias, diabetes, entre outras – são responsáveis por 53% das mortes no país.

Sedentarismo: tema pouco abordado

O diretor-geral do Desporto do Ministério da Juventude e do Desporto, Arte e Cultura (MJDAC), João Rodrigues, defende um trabalho conjunto para aumentar os índices de prática desportiva no país. Acredita que o Ministério da Saúde tem um papel fundamental na questão e que os Ministérios da Educação e do Ensino Superior precisam de investir na formação de professores de desporto.

O diretor sugeriu ainda ao Ministério da Administração Estatal que envolva as autoridades, desde às aldeia até aos municípios, para sensibilizar a população sobre os benefícios das atividades físicas. “Ainda não acontece essa importante cooperação e a falta de conhecimento das famílias relativamente aos benefícios do exercício físico é evidente”, observou o diretor.

João Rodrigues deu o exemplo dos jogos desportivos comunitários, uma política do MJDAC, que procura aumentar o índice de prática desportiva. O diretor-geral do Desporto informou que, neste ano, o orçamento alocado ao programa é de 120 mil dólares americanos, de um total de 1,5 milhões de dólares destinados às atividades desportivas.

Por outro lado, o diretor-interino da Direção Nacional da Educação e Promoção da Saúde, do Ministério da Saúde, Filomeno Pinto Moniz, reconheceu que não há ainda nenhum programa específico para estimular as atividades físicas. Informou que o Ministério chegou a planear ações para combater o sedentarismo, junto da OMS. A iniciativa, no entanto, não se materializou.

Apesar disso, Filomeno Moniz referiu que o Ministério da Saúde encoraja os professores a incentivar os alunos para a prática de desporto. Porém, confidenciou que, quando os técnicos vão falar de saúde nos estabelecimentos escolares, o sedentarismo não é um assunto muito abordado.

A falta de consciência da relação entre o exercício físico e os cuidados de saúde leva a que o médico José Alves tente sempre informar os pacientes, alertando-os para a importância da atividade física e de controlos médicos regulares. “Então, quando os pacientes apresentam sintomas ou doenças relacionadas com o sedentarismo, faço a minha parte e tento alertar para a importância de fazer exercícios para diminuir as chances de apanhar doenças”, explicou.

Segundo o profissional de saúde, na Indonésia, o Ministério da Saúde adotou um sistema em que, de três em três horas, toca um alarme e as pessoas levantam-se, sendo obrigadas a movimentar-se durante cinco minutos. “Não importa o que fazem, desde que se movimentem durante 5 minutos, a cada três horas”, contou.

Para quem alega não ter tempo para treinar, José Alves argumentou que andar também é um exercício. “Se não tiver tempo para fazer exercício, pelo menos, dê umas voltas à sala, antes e depois de ir à casa de banho. Repita isso até conseguir completar o tempo recomendado de movimento”, sugeriu o médico.

Desafios e rotina para manutenção de atividades físicas

Immanuel Assunção Soares, 27 anos, tenta manter os hábitos desportivos no seu dia-a-dia – corrida, flexões, futebol, entre outros. As práticas, diz, ajudam-no a ser saudável, a nível físico e mental. No entanto, por razões profissionais e familiares, confessou que está a ser difícil manter o ritmo.

“Quando treinava com mais regularidade, sentia-me sempre de bom humor e motivado para trabalhar”, contou. Agora, notou que a sua condição física piorou, porque não está a conseguir manter a mesma frequência de treinos. Associada à condição física, admitiu que a sua saúde ficou mais frágil: fica doente mais vezes, tem tosse e sente-se cansado, algo que raramente acontecia.

Já para Milnócia Ribeiro, 25 anos, manter uma rotina para fazer ginástica é fundamental. “Digo a mim própria e desafio-me: preciso de me amar, de ser saudável, de ser consistente”, partilhou.

Ver pessoas, nas redes sociais, que se dedicam ao exercício físico inspira-a e agora é ela que serve de inspiração para os que a conhecem. Fez um horário para exercitar-se, começando com uma semana de treinos. Quando conseguiu, continuou na semana seguinte. Repetiu isso até conseguir completar um mês de atividade. A partir daí, tornou-se um hábito.

“Quando se tenta, o corpo começa a querer mais. Quando o cérebro se habitua ao ritmo, vai dizer-nos que o nosso corpo precisa de exercício ou de descanso. Mesmo quando não sinto vontade, sei que o meu corpo precisa de ginástica para se sentir melhor”, acrescentou a jovem, que começou a sua rotina desportiva em 2021.

Estudante de Medicina da Universidade Nacional Timor Lorosa’e (UNTL), Milnócia Ribeiro afirmou que o exercício físico deve ser assumido como um estilo de vida, porque as atividades físicas promovem a função motora dos músculos e beneficiam a saúde humana. “O meu corpo fica mais saudável e equilibrado, não sinto cansaço e sinto-me bem animicamente”, afirmou.

Milnócia Ribeiro observou que há falta de informação entre os cidadãos sobre os benefícios do exercício físico. “A informação deve chegar aos jovens desde pequenos, incluindo as áreas remotas. Pode ser através das redes sociais ou dos media. Devemos informar os jovens para se tornarem, no futuro, líderes saudáveis, física e mentalmente”, sugeriu.

Comente ou sugira uma correção

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Open chat
Precisa de ajuda?
Olá 👋
Podemos ajudar?